opiniao:-reescrever-historias-ou-apagar-a-historia?-–-penacova-actual

Opinião: Reescrever histórias ou apagar a História? – Penacova Actual

49

Lisa Gambini

Não sou da área das Letras e muito embora goste de escrever alguns desabafos, sobretudo, gosto de ler. Ler é sonhar pela mão de outro, é voar para outro tempo, é ver o caminho de outro ângulo, é evadirmo-nos da realidade e escolher viver outras vidas momentaneamente.

Qualquer escrita é feita num determinado tempo, num determinado lugar e num determinado contexto e, portanto, espelha a realidade ou a ficção de acordo com o enquadramento do escritor nesse tempo,nesse lugar e nesse contexto.

Ultimamente surgiu a discussão em torno da questão de modificar passagens de algumas obras que marcaram gerações, por forma a adequá-las às “sensibilidades modernas”. Quando se fala de reeditar livros, para remover linguagem hoje considerada ofensiva, não consigo deixar de questionar como ficam a liberdade de expressão, a não censura (sim, porque isto não deixa de ser uma forma de censurar o original) e sobretudo, a preservação de obras emblemáticas da literatura.

Os livros foram escritos num determinado momento da História e é de acordo com isso que têm de ser entendidos. Não precisam de estar adequados aos tempos modernos, aliás até nem devem estar, pois só assim se garante a autenticidade e a perceção de evolução das sociedades, no que respeita a hábitos, valores, crenças instituídas, entre outros. 

Muitos dirão que determinadas passagens não são aceitáveis atualmente. Efetivamente podem não ser. Mas, isso não é mau, aliás, até é bom porque significa que progredimos na tentativa de construir um mundo melhor e mais inclusivo. E não é mesmo essa diferença, espelhada na escrita, que permite aprender com o passado e traçar um futuro de melhoria?

Reescrever um livro tendo em conta as sensibilidades do mundo atual, como está a acontecer com as editoras anglo-saxónicas, é adulterar a obra e limitar o conhecimento de quem lê.

Numa sociedade dita evoluída, devemos educar e sensibilizar para valores de respeito, equidade, democracia, tolerância e empatia e, depois, deixar que cada um decida acerca daquilo que o ofende. A alteração de um livro, tendo por base aquilo que se acha que pode ofender ou melindrar é só por si limitante da análise crítica individual e apaga a aprendizagem subjacente à realidade da época e à vivência que se pretende transmitir.

A modificação de obras literárias como, por exemplo, as inigualáveis obras de Agatha Christie ou de Enid Blyton, está a suscitar, e bem, grande polémica. Esta convicção de que os leitores não podem ser confrontados com o que pode ferir a sua sensibilidade é garantir que quem vai ler não poderá ter o prazer de ser transportado para outra época com outras realidades e valores, nem entender que o mundo foi diferente e que, felizmente, a sociedade evoluiu.

A preservação da obras, tal como foram escritas, sem adulterar ou apagar nada, é sem dúvida, respeitar o escritor e a História, mas também a inteligência e massa critica dos leitores.

Lisa Gambini

Compartilhe nas redes sociais

Benvindo(a) à Radio Manchete. 📻

Ouvir 📻
X