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Outras Obras sobre Penacova (18): Roxo… uma Cultura com Raízes de Fé – Penacova Actual

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David Gonçalves de Almeida

A terminar esta série de “Outras Obras sobre Penacova” entendemos ser pertinente trazer aos leitores este livro sobre o Roxo. Quando ali estivémos, por ocasião do Centenário da Revolta do Azeite, chegou-nos ao ouvido que a Drª Maria da Luz Rosa se encontrava a fazer uma recolha sobre usos, costumes, tradições e acontecimentos que marcaram a vida desta aldeia. Soubemos também que aquela professora de História havia coordenado há alguns anos, no âmbito da catequese paroquial [8º ano de 2005/2006], a compilação de orações e cânticos religiosos recolhidos nos contactos orais com as pessoas mais idosas. Trabalho que foi registado num livro policopiado de 95 páginas, encadernado em capa dura no formato A4.

Refere-se na “introdução” que este trabalho “resultou de um desafio lançado pelo Padre Cândido Plácido”, no sentido de ser feita uma reflexão “sobre a relação entre a fé e a cultura”. O repto foi aceite, até porque já existia o desejo de “passar a escrito os testemunhos que crescemos a ouvir.”

O livro, que se encontra dividido em dois grupos, cânticos religiosos e orações, apresenta, a abrir, um conjunto de 51 quadras intituladas “Memórias da Minha Terra” da autoria de Josefina Santos. Aí se recordam as brincadeiras de criança, a guarda dos rebanhos, as festas de casamento, os serões à luz da cadeia a fazer palitos, a emigração para o Brasil, os negociantes de bois, a chegada de melhoramentos públicos (a escola, a estrada para Coimbra, a luz, a água), a Lenda de Valbom e o elogio das paisagens “deslumbrantes, para os olhos regalar, desde a Serra da Estrela até o Mondego entrar no mar.”

“Pensamos que é uma forma de perpetuar no tempo uma herança que ajudou a construir a nossa cultura. Mesmo que, por vezes, não se entendesse todo o sentido da oração que se dizia, o essencial percebia-se: era necessário o respeito por Deus e a prática dos valores cristãos na vida do dia-a-dia. […] A fé influenciava toda a vida da população do Roxo. Marcava o ritmo do trabalho e dos divertimentos; determinava a confecção da alimentação e estava presente nos provérbios, nas lendas e nas tradições em geral. […] O Roxo continua a ser uma terra de fé onde os valores cristãos estão presentes. A nossa cultura é, realmente, uma cultura com raízes de Fé.” – podemos ler no texto conclusivo.

Do vasto conjunto de textos, extraímos:

Tradições

Se andam pessoas a trabalhar no campo, qualquer pessoa que passe ou se vá juntar ao grupo é por tradição dizer:

-Nosso Senhor nos ajude!

E o grupo responde:

-Venha com Deus!

Ao entrar em casa de outra pessoa diz-se:

-Benza Deus tudo!

O dono da casa responde:

-Mais quem vem!

Quando se põem as galinhas a chocar os ovos, também é em louvor de um Santo, ou de uma Santa.

Em louvor de Santo Antoninho, que de cada ovo nasça um pintainho. Em louvor de Santa Rita, que seja tudo galos e só uma pita. Em louvor de Santa Leonor que seja tudo pitas e só um cantor. Se a mulher estiver grávida, não deve fazer este trabalho, cabe ao marido fazê-lo. Diz a tradição da aldeia que se a mulher tiver sorte com os pintos, pode ter problemas no parto.

No dia 2 de Fevereiro, é o dia da Senhora das Candeias. Se a candeia chora (isto é, se chover) está o Inverno de fora. Se a candeia rir (se vier sol) esta o inverno para vir.

(Informante: Josefina Santos; recolha: Lúcia Santos)

Oração feita durante as trovoadas – Maria da Luz Nossa Senhora

S. Gregório se levantou, seus sapatinhos calçou, seu cajadinho pegou, seu caminhinho andou. Lá no meio do caminho Jesus Cristo o encontrou. Jesus Cristo lhe perguntou:

-P’ra onde vais tu S. Gregório?

-Vou espalhar estas tempestades que sobre nós andam armadas.

-Espalha-as bem espalhadinhas, lá para Castro de Mourinho, onde não haja pão nem vinho, nem folha de figueira, nem pedra de sal, nem coisinha nenhuma a que faça mal. Só raminhos bentos nos hão-de salvar. (Reza-se a seguir um Pai-Nosso e uma Ave-Maria).

(Informante: Maria da Luz Nossa Senhora; recolha: grupo do 8º ano)

Responso da Família – oração ao sair de casa ou por quem sai de casa

(Nome da pessoa) sais, com as armas de Nosso Senhor Jesus Cristo bem armada vais, se não é na fé é no corpo, que não seja ferido nem morto, nem mal tratado, nem teu sangue derramado. Lá por onde andares, bons e maus encontrarás. Dos maus fugirás, aos bons te chegarás. Arreda, arreda Satanás que encomendo-me a Deus e à Virgem Maria e a todos os santinhos e santinhas que houverem neste dia e ao anjinho da guarda que me guarde e me acompanhe, que não tenha prejuízo nenhum, nem no meu corpo, nem nos meus haveres, que eu na barquinha de Noé me meto, com as chaves do paraíso me fecho e me entrego a Deus, à luz e à cruz, e ao Santíssimo nome de Jesus, e ao santíssimo Sacramento, e às três relíquias que ele lá tem dentro e às três missinhas do Natal que elas querem, elas podem, elas tiram todo o mal, da alma e do corpo. Pai-Nosso e Ave-Maria.

Responso a Sto António

O meu Padre Santo António, pelas treze horas que jejuaste, pelas treze horas que estiveste, de joelhos, à porta da Virgem Nossa Senhora, a pedir e a rezar que o perdido fosse achado e à mão do seu dono fosse tomado, eu vos peço, por alma da vossa mãe, por alma do vosso pai e pelas almas de vossa madrinha e de uma tia que vós tínheis, que o meu perdido (referir o que se perdeu) apareça. P.N. e A.M., em honra a Santo António.

(Informante: Preciosa Fonte; recolha 8º ano)

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